quinta-feira, 8 de setembro de 2011
Dos caminhos que não se pode fazer a pé, só engatinhando
quarta-feira, 3 de março de 2010
Minhas já tradicionais ausências...
Acho, todavia, que um porquê eu posso dizer agora. O porquê da minha ausência. Esse porquê está no olhar. No meu, ou no dos outros, eu não sei. Acho que é no meu, mas só acho. É aquela diferença entre imaginar uma pessoa correndo sábado à noite porque tem seus problemas, ou simplesmente ver uma pessoa correndo sabado à noite. Talvez a diferença também entre fugir do olhar que cruza quando se anda na rua e fixar o olhar sem fugir como quem quer saber "o que você vai me contar, hein...". É, finalmente, a diferença entre saborear os momentos, vivê-los, deixando que eles fiquem ali no instante e ir atrás deles, imaginar - o que não quer dizer deixar de saborear também, mas não ficar só nisso. Nenhuma postura é superior à outra, só que uma não alimenta com aquela ração diária necessária minha produção escrita. Acho que é isso que eu chamo de criatividade. Uma mistura de experiências com um olhar crítico e curioso. Não existe nada místico além disso. E por um tempo isso me faltou. Nenhum texto veio à luz, ficaram todos escondidos em um caderno escuro - muito bonito e convidativo, mas ainda escuro -, e é possível que alguns venham à luz nos próximos dias.
Com essa satisfação prestada, fico também no aguardo por dias guiados por um outro olhar.
domingo, 5 de julho de 2009
Mais um...
Mais um fruto da disposição que toma conta de mim antes de dormir. Incrível. Ela só não tem sido muito eficaz.
Mar e Ana
Vem cá, menina, não chore. Deixe-me ver seu rosto. É, você é linda chorando. E feliz? Vai me dar a chance de descobrir?
Hum?! Isso foi um sorriso? Não escutei o que você disse. Tome coragem, bote pra fora o que a incomoda. Não quer contar?
Então vem comigo, me dê a mão. Vou mostrar o mar pra você.
Pode vê-lo? É claro que pode. O que achou? Pensando bem, não serei precipitado. Encare-o por um tempo, e aproveite para falar da sua angústia.
Entendo bem. É, sim, compreendo o que quer dizer. Agora, pegue este lenço e enxugue o rosto que, apesar de tudo, eu já estou ficando nervoso de ver seu rostinho assim.
Certo, pronto. Moça... Moça? Não, espere... Seu nome? ... Ana? Bonito. Mas que absurdo, Ana, veja só: fui saber antes o nome dos seus problemas que o seu próprio. Injusto, injusto.
Mas sabe, Ana... Que complicado! Como vou explicar? Não há como você saber se você está certa. Não há provas. Na verdade, querida, não há provas de que exista ou não qualquer prova. Percebe a gravidade das coisas? Não há uma forma eficaz e indubitável de chegar a qualquer resposta. O fundamento dos nossos pensamentos é a ignorância!, o complexo ignorar de tudo que não nos é tangível. Aí está: nada é tangível.
Nós somos personagens de um livro. O que personagens podem saber da verdade? Nada! Nunca vão ter uma visão além das páginas. Então por que se perturbar com algo sem solução? Só faria perder a graça e o sentido das únicas coisas que podemos saborear. Vamos saborear as páginas! Que tal?
É, eu sei, pequena... Nós dois podemos até ser apenas o reflexo das nossas almas. Pior: eu posso ser o reflexo dos devaneios da sua alma! Imagina, então... é o seu pior receio. Mas ele nunca se confirmará, porque, sem ofensas, você é ignorante – como eu já disse. “Que benção”? O que é pior: o medo de ser eterno ou realmente ser eterno?
O seu medo da eternidade é medo da solidão. E se você for uma e o resto for criação sua, na busca por companhia para um momento?
Aninha, o que eu quero mostrar é que o pior é o medo. Sim, o receio. Esquece o medo! Passa a ignorá-lo como você ignora as respostas. Temer uma dúvida é uma verdadeira tragédia. Prefira um romance ou uma comédia à tragédia! Aliás, Ana, quando for chorar novamente, pare e lembre-se de mim. Então, escreva! Sobre o que? Ora...
Olhe pro mar de novo. Ele é eterno, não é? Não é assim que você o vê? Escreve sobre a eternidade dele, coitado. Investigar o sofrer é um exercício de existência. Exista.
Agora eu peço perdão. Ai, desculpa por fazê-la chorar. Não queria deixá-la assim, mas é preciso. Devo voltar ao resto. Não posso apenas escrever pra sempre. Tenho que trabalhar, sabe. Perdão por deixá-la nessas páginas, eterna.
Mas escreve também, Ana. Investigue o mar! Exista!
Não tenha medo da sua eternidade.
sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009
Eis a minha religião
quarta-feira, 24 de dezembro de 2008
Eu me explico
Não encarem, por favor, como mensagem de natal da Globo.
Esse texto foge um pouco ao estilo dos últimos. Infeliz ou felizmente, sabe-se lá, saiu diferente mesmo. Tentei mudar, mas foi assim que ele respirou. Tem um tom mais comunicativo, de aviso, de sensibilização do que de leitura, de contemplação. Não sou avô, mas se puderem, reflitam.
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Era
ou cônica do masoquismo
Há péssimas boas idéias. É verdade, não há boa idéia que se não for tratada não definhe. Não é necessário mudá-la, basta tratá-la.
Jantar naquele lugar de sempre, excelente, luxo de poucos que trabalham ou trabalharam muito. A horrível, deplorável boa idéia deles foi essa, justamente.
Pediram o mesmo prato de sempre, o garçom já lhes veio com a simpatia especial: eram antigos clientes.
Era tudo bom, como havia de ser. Antes não fosse! O inferno nem sempre está abaixo. Nesse encontro em que as mastigadas são as palavras, o sim é o não. Os pescoços estavam imóveis, traindo-se com a novela que passava na TV do estabelecimento. As mãos cortavam às cegas a comida e a entregavam ao destino... Que cena!
Ah! Antes estivesse tudo errado, o salmão mal temperado, ou o garçom viesse com grosserias. Poderiam então se olhar, cúmplices naquela insatisfação e na urgência de buscar uma solução conjunta. Abririam os ouvidos - essas portas que alguns teimam em fechar - um para o outro.
Mas por que ficaram assim? Como foi possível? Foi porque acharam que deveria ser. Era o certo. Todo o esforço para ter essa estabilidade e poder ver TV e comer até o fim. E cuidar dos netos de vez em quando.
Tinham certeza, sim. Certeza de Muito Vivido, que bate o pé e não cede. Talvez estivessem convencidos de que aquilo era felicidade. Ninguém poderia lhes dizer o contrário. Quem sabe fosse felicidade mesmo; alguém teria coragem de atentar contra a alegria do outro? No entanto, talvez... uma reflexão nunca faz mau. Talvez se o cozinheiro tivesse se enganado, ou o garçom errado, teriam feito um favor.
Um grande favor que lhes causaria espanto, indignação... só que no fim perceberiam e seriam gratos de alguma forma. E por "fim" não se deve pensar O Fim, porque esse, graças à descoberta que fariam, estaria longe como há anos não estivera.
O restaurante perdeu, naquela noite, a chance de prestar o melhor serviço de todos... mas não nos esqueçamos.
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Por favor, não saiam jogando suco de uva nas pessoas que estiverem sentadas em restaurantes vendo TV. Pensem, e feliz natal!
sexta-feira, 14 de novembro de 2008
Ai.
"É... mas como o tempo passa!" - aquela conversa de sempre.
"É..."
"Olha só quantos anos passaram desde aquele acidente!"
"Qual deles? A gente hoje em dia só sabe de acidente."
"Sabe que quando eu ligo a TV, sei que verei dois tipos de coisa: acidente e reportagens sobre nós mesmos."
"Não entendi... 'nós mesmos'?"
"Eu entendo o que você quer dizer."
"É... Tá certo..."
quarta-feira, 29 de outubro de 2008
mais um pequeno texto...
e se fosse terça?
Nunca pensou que correria sábado à noite. Não houve, no entanto, alternativa melhor para sair do marasmo deprimente no qual se encontrava..
Que tenha passado outras noites de sábado só... Isso é obvio. Mas há vezes em que a solidão ultrapassava os limites suportáveis.
Escolheu a Lagoa. Levou um aparelho para ouvir música e o telefone celular na esperança de receber aquela ligação que poria fim a toda essa bobagem metafísica.
Começou a corrida ouvindo jazz, estilo que muito combinava com o ambiente a sua volta. A estranha neblina noturna não respeitava o seu limite e trespassava sem dó, mas com delicadeza, seu corpo. Sentia-se inexistente. Não mais só como pessoa, mas só como uma vida em meio a tantas outras coisas. Essa nova realidade mudou tudo: que importava um sábado à noite só? Que fosse assim, tão melhor nessa breve parte de sua não-existência.
Os carros passavam mais rápido que corria em seu ritmo constante. As luzes dos faróis se misturavam, chegando aos seus olhos fracas e indefinidas. O barulho do movimento mecânico já era uma trilha sonora melhor que o jazz – era música do mais refinado tipo. A água escura – esqueça-se que poluída – da Lagoa em leves ondulações... Ah, o que é sábado à noite? Qual a importância disso tudo?!
Prestes a iniciar um movimento eterno, circular como o local e as idéias impunham, avistou uma parte da Lagoa em que havia restaurantes, ali mesmo, entre os caminhos a serem percorridos. De súbito, surgiram pessoas, muitas pessoas. Tal qual a luz agressiva que invade a escuridão, aqueles tomaram sua solidão.
Nem um pouco vexados por desrespeitar o espaço particular de alguém, não se deram por satisfeitos e ainda foram em grupos de dois! Casais? Triste para quem corresse só – sinceramente, quem o faria a essa hora? -, mas se fosse perguntar-lhes... diriam: "Sim, estamos juntos", com um sorriso bobo e distraído de quem vive um bom sábado à noite.
Parou de correr, porque sua calma solidão já não mais existia. Fora muito exigente... que correspondência, que nada! Que seja! Pegou o celular e re-discou um número recente:
"Querido... Não dá, eu topo sua sugestão. Esquece o que eu disse. Cê ainda pode??"
Foi para casa se arrumar. Ai, como dói essa bobagem metafísica. Naquele sábado amaria.
E amou. Amou como a Lagoa e os carros passando a ordenaram, mas ela custou tanto a ouvir... Amou como pessoa.